Acorda (a-corda é) bamba.


Acordar cedo de manhã. Ter de levantar ainda com sono. Não presta atenção se faz um dia bonito, feio, ensolarado ou nublado. Se chove, chuvisca, neblina... Suas pernas tentam encontrar forças para levar-lhe para fora da cama quentinha. Enrolada em tantos lençóis (vermelhos, era sua cor preferida), ela afunda seu rosto no travesseiro e, naquele momento, não deseja sentir nenhuma outra sensação além daquela. Aquela sensação de conforto e maciez que somente a inércia lhe traz.

Toma banho, penteia os cabelos, esconde as olheiras fundas e roxas, toma seu café da manhã - duas fatias de pão com margarina ou goiabada, dependendo do humor, e uma xícara quase cheia de café adoçado - veste-se, coloca seus sapatos, encontra sua bolsa, pega seu computador e finalmente desce. Atrasada, como sempre. O relógio nunca deu-lhe sequer um minuto de tranquilidade. Mesmo quando não tinha "nada para fazer", sentia-se pressionada por justamente isso: estar gastando seu tempo fazendo nada. Complicado sentir-se assim. Sentir-se que não pode, não deve, nunca, jamais relaxar. Jogar tempo fora. Respirar.

Descendo pelo mesmo elevador, dia após dia, percebe que presencia a mesma vista há 16 anos. Quando era menina, recorda-se que havia uma árvore linda que fazia parte daquela paisagem; pensava ser um pinheiro, daqueles que parecem árvores de natal, que havia dado espaço ao que era agora o estacionamento de um restaurante chique. Sinceramente, sentia falta da árvore. Quando pequena, cantava sempre "a árvore da montanha, olê-i-a-ô" enquanto subia naquele elevador. A primeira emoção do dia foi traduzida num sorriso amassado, recém-acordado.

                             

O momento de dirigir até a faculdade era antes o seu preferido. Depois do grande hiatos de 300 dias vividos (ou sofridos?) por ela, esse momento nunca mais foi prazeroso. Parece que a alegria que ela sentia em tão somente ir cantando seus rock's nacionais às oito da manhã, já não existia mais. Ou será que ela estava só "hibernando", em algum lugar em sua mente, sabe-se lá onde? Ela gostaria de voltar a sentir essa energia matinal. O que estaria ela fazendo de errado...? O que estaria hoje diferente no seu dia-a-dia que já não mais a fazia acordar assim... alegre? Não se lembrava de antigamente ser dessa forma por conta de uma paixão, nem de uma conquista, nem de um trabalho bem feito. Era, sem sombra de dúvidas, o fruto de ela sendo ela mesma, no arrepio e excitação do estar só, em seu próprio espaço, podendo ser e fazer o que bem entendesse (o que você faz quando, ninguém te vê fazendo). Sentia saudades de ser ela mesma e se sentir feliz somente com isso.

Chegava em classe e alegrava-se em pensar que teria seu notebook a aula inteira para fazer "o que quisesse". Subitamente após reconhecer esse pensamento, sente-se vazia. Quando sintetiza que a alegria da sua manhã agora se resume em ter um notebook em suas mãos para vasculhar coisas sem sentido e sem valor a manhã inteira, sente-se EXTREMAMENTE vazia. Não consegue encontrar outra definição melhor.

Em contraposição a esse sentimento, tenta pensar nos colegas da faculdade, em sua relação com eles, e instantaneamente pensa naquela menina que costumava ser sua amiga e que, de uma hora para outra, parou de dirigir-lhe a palavra. Desabafa: entre tentar ser uma pessoa "normal" e tentar uma reconciliação e ser sincera consigo mesma, preferiu o segundo e admitiu que preferia assim. Gostava de ser deixada sozinha, no seu canto, fazendo o que bem entendesse. Que pessoa gosta disso? - pergunta-se a si mesma. "Qual é o problema???!!" defendia-se logo após. Tinha que se estudar melhor. Deixar de perder tanto tempo e tanta energia em coisas que, no final das contas, não adicionavam nada. Coisas essas tanto físicas quanto abstratas. Com o coração na boca e a respiração pesada, sentia que já não tinha mais forças para gastar com situações que, no futuro, acabariam não tendo mais valor algum.

Recomeçaria do seu zero.


4 comentários

  1. Ser quem quiser...Que ideia bonita deste texto.
    beijos

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  2. Fala sério, heim, a vida está tão rápida que estou perdendo-me em segundos que deveriam durar para sempre.
    A vida pede um pouco mais de calma, assim como Lenine disse.

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    1. O mídia kit é pra caso de patrocinadores e parceiros: ai você mostra eles!

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  3. AAAAAAAAH que inspiração mulher <3

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